sábado, 19 de novembro de 2011

"Tudo informa luz"



Aurélio de Simoni conta que em 1979 fez sua primeira luz de teatro adulto, em "Ponto de Partida" (Guarnieri). Tinha um momento âmbar e quando o personagem ia subindo a montanha, ele projetava um luz azul na parede, e o corpo do ator, interceptando essa luz, projetava uma sombra nesta parede azul. Escondeu a fonte de luz para ficar mais mágico. Jorginho foi, e Aurélio perguntou o que ele achou deste momento da luz azul, e Jorginho perguntou: Porque azul? E ele pensou e disse: para ficar bonito. Aí Aurélio entendeu que uma luz deve ajudar na locução da cena e não ser um efeito separado dela. "Devia ter continuado no âmbar".



Aurélio disse que não existe luz certa e luz errada. Existe gostei e não gostei, e como sua mãe lhe dizia, gosto não se discute. Falou que com luz, trabalha-se com linguagem subliminar e que existe também a luz crítica que gera o riso. Acrescentou luz errada seria a de cuja leitura é independente da linguagem do espetáculo, o efeito pelo efeito. Disse que no teatro há um cara com a batuta na mão, o maestro – que tem a partitura – enquanto os músicos têm apenas sua parte, e que este maestro é o diretor. Luz não é um exercício particular. Trabalhando-se com teatro se trabalha com a imponderabilidade e não existe matemática, existem formas.



"O teatro é uma arte coletiva por excelência".



Falando do passo a passo da criação, Aurélio ressaltou três ações do ofício do iluminador.



1- Solicitar o texto. O autor propõe através de rubricas situações de luz. Está no texto a informação de que se é um drama, um besteirol, uma comédia em pé... Está no texto as passagens de tempo, como em "Esperando Godot", em que anoitece rapidamente ou há um hiato de tempo entre o dia atual e o próximo dia. O autor informa luz. Que autor é esse? É contemporâneo? É de que época? Um Brecht, por exemplo, pede uma luz sem cor, para manter o público distanciado, para não enlevar ninguém. Aurélio diz ser muito intuitivo.



2- Vou trabalhar com que diretor? Uma luz para Celso Nunes é completamente diferente do que uma luz para Amir Haddad. Alguns diretores falam "Ah, é o Aurélio que vai fazer a luz?" e aí deixam tudo por conta dele. Outros diretores falam "Aurélio, vamos conversar". Aurélio prefere os que falam "vamos conversar". Porque por mais tempo de calçada que ele já tenha, é importante saber dos anseios e das necessidades do diretor para com a peça. Senão ele tem que esmiuçar a cabeça daquele cara para saber que luz fazer. "O Moacir Chaves fica comigo na cabine." Diz que quem não conhece os dois vai achar que estão brigando, mas que é o diálogo deles que trabalham juntos há vinte anos. Em 'Labirinto' tinha um momento que a Adriana ia cantar, Aurélio pôs uma contraluz rosa. Moacir disse "você vai colocar esse rosa viado?" Aurélio respondeu "vou!". Diz que ambos fazem um trabalho conjunto, o que lhe dá muita satisfação ao chegar ao resultado. Lembra da montagem de Macbeth, em que usou apenas 60 micropares. "Era um breu". Aurélio diz aos diretores "Confia no meu tato". Diz que é preciso ter psicologia para lidar com pessoas de teatro, que costumam ser mais corajosas. Hoje, o termo direção geral traduz melhor a idéia do diretor como o maestro da grande orquestra que é o teatro.



3- Ver o ensaio – o grande ato da criação. É quando o iluminador tem contato com o materializado e com a distribuição da cena na cenografia. "É o grande arco e tem várias flechas" pois é quando se tem o contato com a cenografia, com o figurino, com a música, com os adereços, com a produção e com os atores (a parte viva do teatro – o respeito deve ser mútuo). "Tudo informa luz". Em "Assim é se lhe parece", Wilker se levantava, dizia poucas e boas e saía de cena. Um dia, num ensaio, antes de sair de cena ele deu uma parada, olhou para trás e aí saiu. Aurélio então fechou uma luz no rosto dele quando ele olhava para trás.



Para Aurélio, "o iluminador é um privilegiado, porque tudo informa luz". Mas ele "pode acabar com um espetáculo".



Iluminar é mostrar o trabalho dos outros e é uma arte que deve estar integrada com todos os elementos cênicos.



"A luz só acontece onde ela reflete". Aurélio falou o princípio da fumaça volátil (de uma máquina quente) e da fumaça de uma máquina de gelo seco (que é uma fumaça fria que fica em baixo, numa proximidade de 30cm do chão) é este: a luz se reflete pelas micropartículas do ar desenhando o caminho da luz.



"Tem cenário? Tem luz. O cenário determina muita coisa". Iluminar um cenário é mostrar a cenografia na sua plenitude. Quando Aurélio estava começando, Yan Michalski elogiou sua luz mas disse que faltava a luz da continuidade cenográfica, a qual Aurélio explica ser "aquilo que o público vê numa mensagem subliminar". Aurélio percebeu que tinha uma cena em que a personagem abria a porta, e que ele não colocou um refletor para fazer a luz que vinha de fora. Agradece Yan pela crítica. Disse que se um personagem sai de cena dizendo que vai para a cozinha, ele com certeza coloca um recorte de luz como se houvesse uma cozinha na coxia. Falou das luzes cenográficas, que pode ser um abajur, um lustre ou até uma janela.



Há uma vantagem no cinema, que é o direcionamento da atenção do espectador. Já no teatro, a que o Aurélio chama de "arte viva", são os artifícios da iluminação que sublinham a ação principal, que orientam o olhar do público. Já as luzes laterais e a contra luz sublinham o volume.



A respeito do foco, conta que, trabalhando com Aderbal, foi fechar um foco apagando todo o resto. Aderbal lhe disse "mas Aurélio, o cenário continua lá". Aurélio então manteve a contra-luz e nunca mais, a não ser que exigido para troca de cenários, usou um foco eliminando a locação. Um aluno observou que em "As Polacas", há um foco em um buquê de rosas durante todo o espetáculo. Aurélio citou a frase: "Aurélio detesta B.O.", frase que já foi até usada em cena no espetáculo "Bárbara não lhe adora". Lembra que "iluminar é mostrar o trabalho dos outros", o que não diminui o valor de seu trabalho, mas o enobrece. "Tudo informa luz".



Segundo Aurélio, o iluminador deve ser dotado de sensibilidade, criatividade e técnica. "O dia em que minha criança morrer, eu paro de fazer luz".



"O mínimo que podemos fazer é o melhor".

sábado, 12 de novembro de 2011

Tipos de Refletores




"No princípio, criou Deus os céus e a terra. A terra porém estava sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. Disse Deus: haja luz; e houve luz. E viu Deus que a luz era boa; e fez separação entre a luz e as trevas. Chamou Deus à luz Dia e às trevas, Noite. Houve tarde a manhã, o primeiro dia."



E da escuridão fez-se a luz.


"Frases do Aurélio: só existe luz quando nós temos a sombra". Estou fazendo a Oficina de Iluminação Cênica com nosso amado mestre, Aurélio de Simoni. Desde quando fui estagiária com ele, ele sempre foi cheio de ensinamentos e frases iluminadas. As chamadas "frases do Aurélio", ele diz, revelam a forma como ele vê o teatro, ou ao menos o que o faz prazeroso de ali estar, ou seja, não apenas a executando sua função. Outra de suas frases: "Quanto maior o conhecimento técnico, mais asas à sua criação". Como estou a anotar todas as aulas da oficina, vou dividir aqui alguns dos conhecimentos que estou apreendendo.



Para começar, o básico do trabalho do iluminador, conhecer os tipos de refletores e suas especificidades.



Aurélio mostrou nas Dicas de Iluminação, de Valmir Perez (UNICAMP), os tipos de refletores mais utilizados no Brasil:



PC (plano-convexo)



Sua lente é no lado de dentro plana e no lado de fora convexa. Ele é bipino. Tem os Bandós, que no inglês se chamam Barn doors, que se abrem e se fecham para determinar a área de atuação da luz emitida.



Para luz geral, se manifesta numa luz mais equalizada. Já para os banhos, a equalização é menor.



Emite uma luz dura, se sem difusor, e uma luz soft quando com difusor.



Usando como filtro o Silk, se as estrias são verticais, a luz é difundida na horizontal e se elas são horizontais, a luz se difunde na vertical.



Existem luzes de até 40W, cujo filamento de tungstênio fica no vácuo e lâmpadas de até 40W em cujo bulbo há argônio. Mas a luz de maior intensidade é a Halógena, em cujo bulbo, de quartzo, há gás halogênio.


A luz do PC é mais definida, a área de atuação fica bem delimitada, mas não tanto quanto a luz do Elipso.



Se a lâmpada for de 500W, a carcaça é de porte menor. Se for de 1000w, o chassi é maior.



Se a lâmpada se colocar mais próxima da superfície refletora, a área de atuação do foco será maior. Conforme a luz vai se aproximando da lente, a abertura do foco vai se fechando e ganhando mais intensidade (maior concentração)



Possui a alça de sustentação e o caixilho (o porta-gelatina)



Fresnell



O Fresnell assim se chama pois sua lente foi inventada por Augustin Fresnell.


Possui o mesmo chassi do PC, também com bandós para recorta a luz, porém sua lente é plana e possui círculos concêntricos, os círculos eliquodais.



Sua luz é intensa no centro e conforme vai ganhando abertura vai diminuindo num degradê. Não é definível onde a luz acaba. É uma luz mais suave, mais difusa.



Scoop



Muito utilizado na fotografia, é uma parábola refletora que difunde a luz em quase 180º, sendo uma luz bastante dispersa.



PAR



Parabolic Aluminized Reflector de diâmetros 64, 56 (Loco light – utilizada em locomotivas), 38 (o Pin Bean que emite um facho cilíndrico) ou 20, cada um com seu ângulo de espelhamento.



Seu foco é ovalado (exceto a pino) e muito brilhante.



Não abre nem fecha foco. Seu recurso são as diferentes lentes:



FOCO 1 (VNSP – Very Nerrow Spot) emite o foco mais fechado. A lente é lisa e transparente.
FOCO 2 (NSP – Nerrow Spot) difunde um pouco mais a luz. Sua lente é fosca.
FOCO 5 (MFL – Medium Fluid Light) difunde mais a luz. Sua lente possui estrias, raias.
FOCO 6 (WFL – Wide fluid Light) difunde mais ainda a luz. Sua lente possui mais estrias, raias.



Conforme se ganha no aumento do diâmetro de alcance, se perde em definição do foco.


Exemplo de Lâmpada PAR é o Sealed Bin, o farol do fusca. A lâmpada PAR surgiu, tal qual como conhecemos hoje, em 1956. É o principio do farol de carro: uma unidade é composta por uma lâmpada, o espelhamento e a lente e se ela queima, todo esse conjunto deve ser jogado fora.


Há 20 anos, o preço de uma lâmpada PAR era muito elevado, e sua vida útil era da apenas 400 horas (metade do que é hoje) e caso ela queimasse, trocava-se apenas a lâmpada de quartzo por uma nacional muito maior, e em consequência, haja visto que a eficiência do conjunto é proporcional à pontualidade da fonte luminosa rumo ao ponto foco da parabólica, sua eficiência caía 60%. A esta, dava-se o nome de lâmpada ÍMPAR, que demonstra ignorância a respeito da origem e do funcionamento da lâmpada PAR, nome entendido por muitos pelo fato de elas se ligarem de duas em duas, 120v + 120v, ao passo que a ímpar era ligada individualmente em 240v.



Elipsoidal



A curvatura geométrica do espelhamento (área de reflexão) é uma elipse. Tem uma (o liquoidal) ou duas lentes que se movem para abrir ou fechar o foco. A luz é desenhada antes das lentes, através dos obturadores de luz que são as palhetas de corte - as facas, a íris (diafragma) e os gobos (máscaras de efeito) que ficam antes do tubo da lente. A imagem produzida é invertida, de forma que para se cortar a luz do lado direito da luz, fecha-se a faca da esquerda, e vice-verso, e para se cortar a luz em cima do foco, fecha-se a faca de baixo.



A lâmpada do elipsoidal é dicróica, ou seja, seu espelhamento é multifacetado.



Existem ETCs de 05 a 90 graus (ETC – Eletronic Theater Control – empresa americana X Telém –empresa brasileira). Quanto menor a abrangência maior a intensidade (concentração).


Ele pode substituir o PC e o Fresnell, desfocando um pouco para substituir o primeiro e desfocando mais para substituir o segundo.


Moving Light


Inicialmente, Moving Mirrow, o refletor emitia uma luz parada em direção a um espelho que se movia, e assim, refletia uma luz em movimento, de acordo com a lei da física de que o ângulo de incidência é igual ao ângulo de reflexão.



Sua lâmpada é de disparo, logo, fica acesa o tempo todo e sua entrada e saída é determinada pelo diafragma que se abre e se fecha.



Depois vieram os Moving Heads, que emitiam dois tipos de luz em movimento: o Spot (através da lente PC) e o wash (através da lente Fresnell)



Ciclorama / Soft light / Set light



Os três são refletores para se iluminar o ciclorama. O Soft e o Set light são refletores sem lente e a luz é bastante abrangente e assimétrica para banhos de luz.


Um pequeno refletor, chamado Wall-Washer, iluminava os fundo cenográficos da TV. Com a única função de iluminar sets, recebeu o nome Set Light, e pode ser encontrado nos tamanhos pequeno, médio e grande.


Mini-brut



Lâmpadas PXE usadas para iluminar a platéia.




Canhão (Follow Spot/ seguidor)


Pressupõe um tripé e um operador. Sua lâmpada é de disparo, de forma que já deve estar acesa antes de se abrir a íris para se abrir o foco. Ele tem duas lentes, duas facas (palhetas de corte).


O Canhão seguidor tem características parecidas com a dos Elipsos, porém tem ótica mais sofisticada e corpo mais robusto, chegando a pesar 45kg.



LED (Diodo Emissor de Luz)


Não é da realidade teatral brasileira ainda, pelo alto preço. Ela não tem filamento e sua vantagem está na redução de consumo e baixa emissão de calor. Ela tem as três cores-luzes primárias, Red, Green e Blue (RGB) a partir das quais muda a cor de sua luz. Porém, a temperatura-cor de seu branco não é como a de uma luz de filamento, e ela ainda não é dimerizável e não é possível uma mudança lenta de uma cor para outra.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Quem sou eu - Bia Kleber

Olá!
Meu nome é Bia Kleber e eu sou a mais nova colaboradora do Blog do Aurélio. Tenho 25 anos e sou de Londrina (PR), onde comecei a fazer teatro com 12 anos de idade, na Escola Municipal de Teatro da FUNCART, onde estudei e fiz peças até os 15 anos. Então fui para os EUA, fazendo um curso técnico de teatro no Southern Vermont Carreer Center por um ano. Voltei e vim para o Rio de Janeiro, ingressei na CAL, onde fiz um ano do curso profissionalizante junto com a Manu Berardo, que foi onde nos conhecemos. Segui para a UNIRIO, onde estudei por quatro anos e meio o Curso de Licenciatura em Artes Cênicas. Fiz várias peças, tive aulas que marcaram minha trajetória teatral e artística. Fiz estágio dando aulas na Casa de Custódia Frei Caneca. Estagiei com Paulo Trajano, em suas aulas de Expressão Corporal na CAL, com Marco Rodrigo, em sua Oficina de Interpretação para TV e com Analu Palma, num trabalho com atrizes cegas. Danço Butô e dei uma oficina de teatro-dança Butô para a Cia. de Atores Invisíveis, na Fundição Progresso. Faço pós-graduação no Sistema Laban/ Bartenieff na Angel Vianna. Conheci o Aurélio através da Manu. Numa peça dirigida por Ivan Fernandes, eu era stand-in e comecei a acompanhar os ensaios. Percebi a falta dos adereços cênicos em vésperas da estréia e me ofereci para suprir essa falta. A luz dessa peça foi feita por Aurélio, e não me esqueço dele falando no camarim no dia da estréia: "Faço teatro há 30 anos e sei que tem gente que é de teatro e gente que não é de teatro. Você é uma pessoa de teatro." Isso foi em 2006, e eu comecei a estagiar com Aurélio. A primeira peça foi em Niterói, também não me esqueço da viagem na barca com ele. A peça era "Alarme Falso" com Eri Johnson. Aurélio sempre muito atencioso e dizendo "se você não souber de alguma coisa que você vir ou ouvir, PERGUNTE". Depois o acompanhei em "Isadora Duncan" com a Letícia Spiller, em que passei 25 horas ao lado do mestre Aurélio pois após a montagem eu fiquei para assistir ao Aurélio gravando a luz. Também acompanhei o seu trabalho em "Macbeth" e "The Cachorro Manco Show" de Moacir Chaves e a bela luz de "O Baile", direção do José Possi Neto. Fiquei ausente do Rio por alguns anos por questão de saúde, mas agora voltei e estou fazendo a Oficina de Iluminação Cênica com Aurélio, produzida pela EFAL, e também a Oficina de Cenografia com Hélio Eichbauer no Dulcina. O teatro engaja meu ser como um todo, respiro arte e sem ela minha vida seria sufocante. Acompanhar grandes mestres da arte sempre foi uma forma de crescer como artista e como pessoa, e acompanhar o Aurélio é ter acesso não só à grande arte que ele constrói mas também ter acesso à história viva do teatro neste país, pois o "velho" (modo como ele se refere a ele mesmo) tem muita história para contar. E conta, viu? Estar com ele é sempre um aprendizado. Só tenho a agradecer ao mestre, com carinho. Obrigada por ser essa imensa generosidade que você é, Aurélio. Beijos para você e para todos que por este blog buscam um pouquinho de sua maestria.
Bia.